domingo, 20 de dezembro de 2009

- Santa Cruz do Rio Pardo

1. Das origens 
Entre 1850 e 1851, na avançada pelo sertão centro sudoeste paulista, a cada cinco ou seis léguas, o chefe bugreiro José Theodoro de Souza, ou à sua ordem, tinha sempre o cuidado primeiro em escolher local de arranchamento e levantar uma cruz, denominar o lugar sob a invocação de um orago, geralmente o do dia, ou identificação geográfica (rios, morros e furnas) quando não, algum traço marcante com o qual distinguido, como floresta, espécie vegetal, predominância de qual tipo de aves, entre outras observações de acontecimentos notórios, após o que construir dois ou mais ranchos coletivos para neles instalar homens, fortemente armados, para reconhecimento e medições de terras, localizações de possíveis predecessores e caçar índios e animais selvagens, com isso a amanhar o sertão para a chegada das famílias em relativa segurança.
—Francisco de Paula Moraes, genro de José Theodoro de Souza esteve entre os primeiros 'donos' de terras em Santa Cruz, comprovado por documento de venda de terras ao capitalista José da Costa Allemão Coimbra, tido autêntico e juntado ao processo da legalização de posse (DOSP, 18/06/1909: 4310-4311).

A Manoel Francisco Soares coube porção de terras compreendidas entre o Pardo e Turvo santa-cruzenses, abrangendo as então fazendas pioneiras Santa Cruz - no Pardo, São Domingos, Crissiumal e, já no Turvo, a Jacutinga. Iniciou domínio no Turvo para depois fixar arrancho no pontal Pardo/São Domingos, tratando-se de lugar entendido salubre, com boa fonte de água, além de estratégico para os proprietários e trabalhadores nas fazendas adjacentes, servindo como melhor local de moradias, e onde as travessias fluviais mais fáceis.

A sede da fazenda Santa Cruz foi o núcleo onde o marco inicial urbano santacruzense, na região do chafariz, e trazia o nome Bairro Santa Cruz, citado em assento batismal lavrado na matriz de São João de São Domingos, aos 25 de junho de 1857, de:

—"André, filho legitimo de Antonio Rodrigues de Moraes e Ana Apparecida da Conceição, da freguezia de Campestre, da Provincia de Minas Gerais, que residem no bairro de Santa Cruz. Forão padrinhos Jose Manoel de Andrade e Dona Maria da Conceição" (Igreja Católica/SGU, SCR. Pardo, 1856/1884).

O arraial, no entanto, antecede as divisões de 1855 promovidas por Soares, considerando que a preparação de fazendas postas a vendas demandava cerca de quatro ou cinco anos para as dimensões, demarcações, aberturas de caminhos e as derrubadas de matas, bem como o imediato arrancho para o abrigo e segurança dos empregados. 

O bairro Santa Cruz foi apenas mais um dentre os surgentes na região, entre os anos 1851/1862, conforme o avanço sertanejo, todavia lhe dado destaque regional em 1858/1859 classificado como o 7º Quarteirão de Eleitores do Rio Pardo, para a freguesia de São Domingos, no município de Botucatu.


1.1. Os patrimônios que formaram a cidade 

Duas doações patrimoniais para a Santa Cruz e Santo Antonio, nos anos de 1861/1862 e 1868 respectivamente, foram fundamentais para a formação do povoado. 


1.1.1. Santa Cruz
Em 1861/1862 o fazendeiro Manoel Francisco Soares doou cem alqueires de terras ao patrimônio da Santa Cruz, sob a administração da Igreja, para a oficialização de uma Capela sob a denominação Santa Cruz do Rio Pardo:
—"Capella de Santa Cruz do Rio Pardo – Não consta escritura alguma com referencia ao patrimonio daquela Capella, mas pelos papeis existentes na Câmara Eclesiástica, sabe-se que o patrimonio da referida capella foi feito por Manoel Francisco Soares, que doou em 1861 ou 1862, uns terrenos cujas divisas acham-se compreendidas entre o ribeirão de S. Domingos, principiando na confluência deste ribeirão com o rio Pardo, de um vallo, que vai do mesmo ribeirão ao rio Pardo, e deste à mesma confluencia, onde tiveram principio e fim" (ACMSP, Relatório dos Bens Imóveis da Diocese de São Paulo de 1904: 55-56, documento resgatado por Lorana Harumi Sato Prado).
—O Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo traz a mesma informação, em matéria assinada por Cavalheiro Freire, Inspetor Diocesano (Correio Paulistano, 24/abril/1941: 5 - Cappelas do Estado de S. Paulo). O autor trata-se do Padre Inspetor Diocesano Paulo Aurisol Cavalheiro Freire.

Documentos resgatados junto a Cúria Diocesana de Ourinhos mostram as comprovações da Igreja, em 1893, sobre a posse das terras doadas por Soares ao Patrimônio da Santa Cruz, desde 1861/1862, onde instalada a povoação (Documentos Avulsos para Santa Cruz do Rio Pardo).

O padre João Domingos Figueira, morador do lugar desde 1861, confirmou em carta de 1864: "O patrimonio doado tem sem [sic] alqueires, mais ou menos, terreno proprio para grande povoação, agua pelo alto com abundancia, apresenta este logar um futuro risonho" (ACMSP, Documentos avulsos para Santa Cruz do Rio Pardo, cópia, cortesia de José Carlos Pereira de Souza). 


1.1.2. Santo Antonio
O casal José dos Santos Coutinho e Rita de Sene, genro e filha de Manoel Francisco Soares e Ignácia Porcina de Sene ou Senne, aos 09 de março de 1868 doaram vinte alqueires de terras ao Patrimônio do Santo Antonio, conforme escritura lavrada em São Domingos (Livro de Notas, nº 3, fls. 59-v a 60-v, 1º traslado pelo Tabelião de Santa Bárbara do Rio Pardo, aos 04 de dezembro de 1891).
O terreno pertencera antes a João Paulo Garcia, extraído da primitiva posse de Faustino Machado de Oliveira.
Documentos de 1893 revelam posse imediata da Igreja sobre aqueles bens, já em 1868, formando povoado (Cúria Diocesana de Ourinhos – Documentos Avulsos para Santa Cruz do Rio Pardo). No ano de 1900, mapa do Patrimônio de Santo Antonio revelava, em verdade, pouco mais de 24 alqueires (Prefeitura SCR. Pardo, Cadastro, resgatado por Julia Maria Andreolli).
Num longo e discutido processo, após a laicidade do Estado, a Câmara Municipal desapropriaria os terrenos da Igreja (Patrimônios de Santa Cruz e Santo Antonio) a favor da Municipalidade, com transmissão oficializada (Cartório Oficial de Registro de Imóveis, Certidão de 08/03/2006, da Escritura Pública de 05 de fevereiro de 1903, Livro 3-L (antigo) de Transcrição das Transmissões).

1.2. Formação da Capela Santa Cruz do Rio Pardo 
Crônica de 1887 informa que o pioneiro Manoel Francisco Soares residia na sede da sua fazenda, onde "uma cruz de madeira, que orgulhosamente se ostentava na beira do terreiro de sua habitação" (Almanach, 1887: 541), e outras moradias havia, daí o nome Bairro Santa Cruz, posteriormente elevado a Capela, com o designativo Santa Cruz acrescido do Rio Pardo.
Soares mandara, ainda, construir pequeno espaço religioso, coberto "com taquáras rachadas e sobre-postas umas ás outras (...). E desde então ficou a Santa Cruz como sendo a padroeira da povoação" (Almanach para a Província de São Paulo, 1887: 542).

A mesma crônica aponta a presença do padre João Domingos Figueira, fazendeiro residente no denominado Bairro Santa Cruz, vizinho de Manoel Francisco Soares (Almanach da Provincia de S. Paulo, 1887: 542), sendo este o doador de terrenos para o patrimônio da Santa Cruz, em 1861/1862, nos quais o padre pôs-se a trabalhar para a formação urbana, com o rossio e ereção de templo religioso, permitindo a elevação do bairro à condição de Capela, identificada Santa Cruz do Rio Pardo, jurisdicionada à Freguesia de São Domingos, no município de Botucatu.

Ausente qualquer expediente anterior de oficialização, aos 23 de novembro de

1862 o povoado teve sua primeira identificação conhecida, como Santa Cruz do Rio Pardo num ofício expedido pela Câmara Municipal de Botucatu à Presidência da Província de São Paulo:

—"Ha neste Municipio sette Igreijas, a Matriz desta Villa, a de Lençois, a de São Domingos, da Piedade do Rio do Peixe, a de Santa Crus do Rio Pardo, da Santa dos Remedios no Tiete, e a do Rio Novo, as treis primeiras pouco tem sido auxiliada pelo Governo, e as ultimas mais pequenas porem decentes e feitas a custa dos fieis, pelo que V.Exa. colligera que neste Município o povo he religiozo o que sertamente satisfara ao Governo de V.Exa. para assim ajudal-los" (DAESP/BTCT, Documentos: Ofícios Diversos).

Aos 25 de novembro de 1862, também a Igreja reconheceria o lugar como Capela Santa Cruz, no registro de batismo de Maria:

—"(...). Na Capela filial de Santa Crus Baptizei pus santos oleo na inosente Maria de idade de tres mes filha legitima de Mizial [e] Rozalia, Escravo do Padre João Domingos Figueira, forão padrinhos Jose Peres das Chagas e Maria Inosencia da Conceição (...) - Padre Andrea Barra" (Igreja Católica/SGU, 1859/1879).

Padre Figueira, referindo-se a Santa Cruz do Rio Pardo dos anos de 1862, descreveu-a como:

—"(...) nova povoação cujo povo bem dedicado ao servisso de Deos e da Igreja com minha estada de dois annos fes se uma Capella môr, forrada, assoalhada, com Prezbiterio, altar, trono, sacrário, e retabulo. O patrimonio doado é de 100 alqueires já conta com 18 a 20 fogões no arraial. A afluencia do povo é immensa" (ACMSP, Pasta de Documentos Avulsos para Santa Cruz do Rio Pardo, cópia, cortesia de José Carlos Pereira de Souza).

O edifício sacro construído pelo padre Figueira, ou às suas ordens, situou-se onde parte dos fundos do atual templo São Sebastião - praça Dr. Pedro Cesar Sampaio, construção de 1862, com as medidas de 40 por 60 palmos, equivalendo a 8,80 metros de frente por 13,20 de fundos, e que necessitou, apenas, de pequenos reparos para servir de igreja matriz, em 1873 (Cúria Diocesana de Ourinhos, Documentos para Santa Cruz do Rio Pardo, Processo para elevação de Freguesia Canônica, 28/12/1872).


1.3. Freguesia

Na condição de freguesia, em cumprimento ao dispositivo da Lei nº 71, de 20 de abril de 1872, fez-se o primeiro registro oficial de divisas para Santa Cruz do Rio Pardo, descrito em documento da Câmara Municipal de Lençóis Paulista, Sessão Legislativa de 26 de outubro de 1872, encaminhado ao Governo da Província, e assim estabelecido:

—"Principiando-se no rio Alambary, no logar chamado dos Cardosos, procuram o espigão e por este abaixo até frontear o ribeirão de Santa Clara. E por este ribeirão acima até ultimas cabeceiras e d’aqui, o rumo, ao rio Pardo por entre as terras de Manoel Baptista e Antonio de Oliveira Marinho e por estas, a rumo, até o rio Paranapanema, divisando sempre com a Freguezia de S. Domingos e pelo lado opposto com o sertão." 
O Governo da Província de São Paulo aprovou a decisão camarária lençoense, por Ato de 09 de novembro de 1872. 
Pela Constituição de 1824, o poder civil criava freguesias, pelas Assembleias Provinciais, cumprindo a Igreja confirmá-las, com o significado de povoação formada, organizada e territorialmente delimitada, urbana e rural, com suas divisas definidas e extensivas sobre os bairros e capelas que lhe seriam subordinados.
Aos 13 de janeiro de 1873 a Carta de Provisão Eclesial confirmava o ato da Lei nº 71, de 20 de abril de 1872, vigorando desde então as mesmas divisas:
—"Aos que esta Provisão virem, saúde e paz para sempre em o Senhor.
Tendo a Assembleia Legislativa Provincial por lei n. 71 de 20 d’abril de 1872 elevado à Cathegoria de Freguesia (Paróquia) esta Capella de Santa Cruz do Rio Pardo do Município de Lençóis, e attendendo ao que me representou Joaquim Antonio da Silva por parte do povo d’aquele lugar, hei por bem pela presente confirmar como por esta Provisão confirmo, erijo e canonicamente instituo aquella Freguesia na forma do Sagrado Concílio Tridentino, concedendo-lhe todos os direitos, privilégios, honras, insígnias distinções que lhe pertencem como Egreja Parochial, que de hoje em diante fica sendo, vigorando as mesmas divisas pelo que diz respeito a Estolla, que pelo Poder civil lhe foram dadas. Esta será publicada à estação da Missa Conventual dum dia festivo e registrada no livro do Tombo da Matriz para a todo tempo constar. Dada na Câmara Episcopal de S. Paulo, sob meu signal e sellos das armas, aos 13 de janeiro de 1873." (Debate, 16/01/2005, apresentação pelo Frei Lourenço Maria Papin).
Na ocasião o Bispo Diocesano de São Paulo, Dom Lino Deodato Rodrigues de Carvalho, presente na solenidade, inaugurou o templo religioso, construído em 1862, como Igreja Matriz – pós reforma e adaptações, na antiga Praça Anchieta, e designou o Padre João Domingos Figueira como Vigário Encomendado (ALESP, CO. 73.1.1, de 15/01/1873).

1.4. Vila e município
Aos 03 de fevereiro de 1876 a Assembleia Legislativa Provincial de São Paulo aprovou a elevação de Santa Cruz do Rio Pardo a vila (ALESP, PR 76.6.3), depois decretou e o Governo [Executivo] Provincial de São Paulo sancionou a Lei nº 06, de 24 de fevereiro de 1876:
—"Artigo 1º - A Freguezia de Santa Cruz do Rio Pardo, do município de Lençóes, fica elevada à Villa, a que ficará pertencendo a Freguezia de São Pedro do Turvo.
§ 1º - As divisas da nova Villa serão as actuaes.
Artigo 2º - O Governo reverá e corrigirá opportunamente as divisas entre as duas Parochias de Santa Cruz do Rio Pardo e São Pedro do Turvo, tendo em vista as informações que lhe prestar a Câmara da nova Villa."
Alguns argumentos foram favoráveis à emancipação político-administrativa: Santa Cruz tinha um deputado provincial influente, o coronel Emygdio José da Piedade, população crescente e lugar considerado 'empório do sertão', com entreposto comercial forte e local de ajustes, num tempo de grande expansão sertaneja adiante, com surgimento de novos povoados, oferecendo condições econômicas favoráveis com agropecuária forte, significativa criação de suínos, e serrarias.
A administração da vila, conforme legislação, seria exercida pela Câmara de Vereadores, com mandato de quatro anos, e elegíveis e votantes todos os cidadãos, alfabetizados ou não, residentes no município nos dois anos anteriores aos pleitos, desde que contassem renda anual igual ou superior a 200 mil réis.
Caso o eleitor ou postulante a cargo eletivo fosse acatólico ou estrangeiro naturalizado, então necessitava de alfabetização, além da renda exigida.
O território urbano santa-cruzense pertencia aos patrimônios da Santa Cruz e do Santo Antonio, portanto à Igreja, e seria doravante administrado pela Câmara, mantendo-se os aforamentos e reservados os direitos sobre o cemitério, exclusivamente católico.
A passagem de freguesia à vila consolidou-se através das eleições de 1876, para a 'Câmara de Vereadores e Juizado de Paz', mandatos 1877/1880.
Santa Cruz do Rio Pardo tornou-se cidade legalmente instituída, somente aos 19 de dezembro de 1906, pela Lei Estadual nº 1.038, e as demais localidades muito depois teriam garantidas as situações pleiteadas.

2. Os fundadores
2.1. Manoel Francisco Soares* 
O pioneiro Manoel Francisco Soares declarou idade de 64 anos, em 1858, na sua qualificação eleitoral para o '7º Quarteirão do Rio Pardo, Freguesia de São Domingos, Município de Botucatu' (AESP, 1859, Ofícios Diversos para Botucatu).  Nascido por volta de 1795 teria, portanto, 57 anos em 1851 quando chegou ao sertão Turvo/Pardo santa-cruzense, à frente de um bando de bugreiros - matadores de índios, numa exterminação impiedosa das etnias existentes, assumindo as terras desocupadas para formações das 'primeiras fazendas na região'.
Documento oficial de 1878 informando Manoel Francisco Soares com idade de 83 anos ([D]AESP, Qualificação Eleitoral para Santa Cruz do Rio Pardo, 1878: 3 - gentileza do acervista Geraldo Vieira Martins Junior), ratifica, implicitamente, seu nascimento ao redor volta de 1795, talvez em Aiuruoca - MG, filho de Athanazio Soares e Joanna Maria de Chaves, casados em Aiuruoca - MG aos 15 de junho de 1871 (Livro de Matrimônios 1760/1779: 72-73), ele filho de Francisco Soares de Aguiar e Antonia Rodrigues do Lago, ela filha natural de Izabel de Chaves, sendo a Izabel filha do "Faustino de Chaves [Leme] bastardo e da sua mulher Pascoa [Paschoa] de Flores preta forra" sem interesses para o presente trabalho, pois, já no campo das genealogias, e, ainda, a merecer melhores aprofundamentos. 
— O livro de assento batismal de Aiuruoca, para os anos de 1794/1796, não consta no acervo eclesial atual - 2021 - disponibilizado para consultas (https://www.familysearch.org/pt/), o que impede saber se lá nasceu ou não o Manoel Francisco Soares, todavia, em registro de 12 de agosto de 1816, na mesma Aiuruoca, consta o óbito de Joanna Maria de Chaves, já viúva de Athanazio Soares de Aguiar, classificada, por informação, como septuagenária (Livro de Óbitos, 1808/1835: 79), embora, mais corretamente, idade em torno de 60 anos.
—Cumpre o registro do nascimento/batismo de Manoel, filho do casal Athanazio e Joanna, batizado em Aiuruoca aos 25 de setembro de 1779 (Livro 1760/1793: 51), certamente falecido na primeira infância, de tal modo o mesmo nome dado a outro filho gerado anos depois - 1794/1795.
Manoel Francisco Soares aparece pela primeira vez, ano referência 2021, na sua história conhecida para Santa Cruz do Rio Pardo, aos 08 de fevereiro de 1818, no batizado do filho Miguel, em Capela São João do Nepomuceno, Lavras - MG, ele e a mulher Ignacia Porcina de Senne como "(...) agregados do Capitão Andre Martins de Andrade." (Eclesial, Livro 1805/1829: 206).
O casal Senne/Soares teve, ainda, os demais filhos e filhas 'resgatados' documentalmente conforme, a seguir, os registros eclesiais:
-Maria, batizada em Capela de São Bento de Campo Alegre - Lavras, ao 1º de novembro de 1819 (Livro 1805/1829: 221); dela, nada se sabe no sertão.
-Ritta Porcina de Senne: batizada aos 15 de fevereiro de 1821, em Rio Verde (Eclesial, Livro Índice de Batismos, Campanha/Santo Antonio, MG, 1813/1824: 333), sendo padrinhos Miguel Justino do Espírito Santo e Anna Ignacia de Lima, tidos avós pelo lado materno. Ritta casou-se com José dos Santos Coitinho, em Caconde - SP, aos 20/11/1843 (ABRASP, 1839/1863, Rolo 6: 35/36) sendo este o casal doador de terrenos ao Patrimônio de Santo Antonio, em 1868, incorporado à formação de Santa Cruz do Rio Pardo.
-Antonio Francisco Soares: nascido por volta de 1823, casado com Anna Lauriana Vieira, aos 23 de fevereiro de 1846 (Eclesial, Silvianópolis - MG, Matrimônios: 1842/1873: 29).
-Joaquim José Soares, nascido por volta do ano de 1826, casado com Maria Antonia da Luz, em data de 29 de julho de 1847 (Eclesial, Matrimônios, Silvianópolis - MG, 1842/1873: 34). Segundo Leoni (1979: 5) o Joaquim mudou-se com sua numerosa família para a região de Conceição de Monte Alegre - atual Paraguaçu Paulista.
-Justino Soares: nascido por volta de 1828, casado com Antonia Maria dos Sanctos, aos 02 de dezembro de 1850 (Eclesial, Matrimônios, Araraquara - SP, 1842/1865: 39).
-Pedro Francisco Soares: nascido aos 17 de novembro e batizado aos 02 de dezembro do ano de 1830, em Silvianópolis - MG (Eclesial, 1800/1835: 67). Não teve história conhecida no sertão, porém sabe-se do seu filho, Joaquim Tito Soares, nascido em 1871, eleitor em 1904 (Livro Eleitoral - Resumo dos eleitores das Seções Federais, Santa Cruz do Rio Pardo, 1904).
-Anna Porcina de Senne: nascida aos 22 de junho e batizada aos 22 de julho de 1832 (Eclesial, Livro de Batismos, Silvianópolis, MG, 1800/1835: 82), casada com José Domingos ou Domingues de Chaves, em São Bento de Araraquara, em 04 de fevereiro de 1851 (Eclesial, Livro 1842/1865: 40). Anna, já viúva, faleceu em Santa Cruz do Rio Pardo, aos 21 de outubro de 1896 (Eclesial, SCR.Pardo, Óbitos Livro 1883/1897: 48).
-Francisco Soares, já citado, nascido aos 08 de dezembro de 1833, e batizado em 01 de janeiro de 1834 (Eclesial, Livro de Batismos, Silvianópolis - MG, 1800/1835: 103), casado com Hipolita Maria de Jesus (Eclesial, Batismos, Botucatu 1856/1859: 80, a 04/09/1858, no batismo de José, filho de Antonio Francisco Soares e Anna - referências registro 1537).
-Joaquina: nascida aos 30 de junho e batizada aos 14 de julho de 1835 (Eclesial, Silvianópolis - MG, Livro: 1797/1837: 7), conhecida no sertão pelos nascimentos das filhas, Anna, os 08/01/1857 e batizada aos 09/03/1857 (Eclesial, Botucatu, Batismos Livro 1856/59: 21), e Prudencianna, batizada em São Domingos, aos 20 de novembro de 1862, idade de 04 meses (Eclesial, Santa Cruz do Rio Pardo - SP, 1859/1879: 192), ambas as crianças filhas de pai incógnito.

2.1.1. Da [possível] viuvez de Manoel Francisco Soares
No casamento de José dos Santos Coitinho com Ritta Porcina de Senne, aos 20 de novembro de 1843, em Caconde - SP, ela é apresentada como "(...) filha legitima de Manoel Francisco Soares e Ignacia Porcª de Seny já falecida (...)." (ABRASP, Caconde - SP, Matrimônio 1839/1863, Rolo 6: 41/42), porém, numa citação antecedente, para o mesmo ato matrimonial, consta Ritta "(...) filha legitima de Manoel Francisco Soares e de Ignacia Purcina de Seny (...)." (1839/1863, Rolo 6: 35/36), ou seja, não mencionado falecida a Ignacia, com isso a dúvidas se um documento desdiz o outro quanto a viuvez do pioneiro.
Manoel Francisco Soares, posteriormente, citado 'casado', em Brotas - SP, no batizado do neto Joaquim, filho de Justino Soares e Antonia Maria, aos 14 de março de 1852 (Livro 1843/1864: 115/116), todavia desacompanhado de sua mulher Ignacia Porcina, sendo madrinha a Joaquina dos Santos Coitinho. À mesma maneira, dona Ignacia ausente no batismo do neto José, filho de Antonio Francisco Soares e Anna Lauriana Vieira, aos 04 de setembro de 1858 em Botucatu (Livro 1856/1859: 80), onde Manoel Francisco Soares é o padrinho ao lado da nora Hypolita Maria de Jesus, mulher do filho Francisco Soares, ocorrências que bem poderiam confirmar morta a dona Ignacia.
Sem qualquer informação, até 2021, de novo matrimônio ou o nome de possível cônjuge, no sertão entre 1851e 1878, Manoel Francisco Soares é informado ou subentendido, sempre, casado, a exemplos, no livro de eleitores do '7º Quarteirão - Rio Pardo, da Freguesia de São Domingos - Município de Botucatu' (AESP/BTCT, 1859), nos registros anexados em transações de terras (DOSP, 19/03/1898: 23.174), e, também, no rol de votantes da paróquia de Santa Cruz do Rio Pardo em 1878 (DAESP, 31/08/1878).

2.1.2. Outras informações sobre o pioneiro Soares
Após Caconde - SP, Manoel Francisco Soares tem citação em Araraquara - SP, aos 02 de dezembro de 1850 e 04 de fevereiro de 1851, nos casamentos dos filhos Justino Soares com Antonia Maria dos Sanctos [Chaves], e Anna Porcina Soares com José Domingos Chaves.
—Antonia Maria e José Domingos eram irmãos, filhos de José Francisco Chaves e Joaquina Maria dos Santos, também pioneiros em Santa Cruz do Rio Pardo.
A presença de Manoel Francisco Soares na região santa-cruzense, então território da ainda Capela de São Domingos, remonta ao ano de 1851/1852, com a posse no Turvo da 'Fazenda Jacutinga', da qual extraída a Crissiumal, e a divisa 'Fazenda Santa Cruz' no Pardo.
Documentos eclesiais e cartoriais - citações em transações de terras, a partir de 02 de março de 1855, confirmam a presença do Soares no sertão, a não restar dúvidas quanto ao seu pioneirismo no Pardo/Turvo santa-cruzenses.
Em 1858 Soares e seus filhos estavam entre os qualificados votantes para as eleições de 'Juízes de Paz da Freguesia de São Domingos', de acordo com a ata organizada pela 'Mesa Paroquial', datada de 17 de julho de 1859.
—No quadro de eleitores figura certo "José Francisco Soares, casado, 31 anos", tido pelas tradições sobrinho do pioneiro, mas nenhum documento ainda localizado, referência 2020, que possa assim atestá-lo.
O nome de Soares não constou nas solenidades que elevou Santa Cruz à condição de freguesia pelo poder civil, em 1872, ratificada eclesialmente no ano seguinte. A sociedade civil não se lembrou dele e a Igreja não lhe prestou memórias. Somente viria ser efetivamente reconhecido, como o primeiro nome da história de Santa Cruz do Rio Pardo, na crônica publicada pelo 'Almanach da Provincia de São Paulo para 1887', transcrita pelos autores no capítulo '1862 - A história referenciada'.
Em 1878 possivelmente a última referência dada ao pioneiro Manoel Francisco Soares, casado, qualificado para o rol de votantes da paróquia de Santa Cruz do Rio Pardo (DAESP, 31/08/1878); na qualificação de 16/071880, seu nome não se encontra na lista de eleitores, podendo significar sua morte em algum tempo entre 31 de agosto de 1878 a 07 de outubro de 1880.

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 *Documentos oficiais levantados aos 19 de setembro de 2021 determinaram a correção parcial da biografia de Manoel Francisco Soares.  

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2.2. Padre João Domingos Figueira
2.2.1. Vida eclesial tumultuada
O padre João Domingos Figueira tem o seu nome lançado em antigos documentos, como o cofundador e primeiro vigário santa-cruzense-do-rio-pardo.
Figueira, português, nascido aos 14 de abril de 1810, na Freguesia do Estreito de Nossa Senhora da Graça de Câmara dos Lobos, filho de João Domingos Figueira e Maria de Faria, batizado em 18 de abril do mesmo ano, conforme "Livro Décimo Oitavo dos Baptizados da Parochial Igreja do Espirito Santo da Villa da Calheta, nelle a folha cento e sincoenta oito verço." De conformidade com transcrição: "Funchal, 13 de Março de 1833" (Apud padre dr. Hiansen, Documentos de Arquivos - ACMSP, 1998).
Vocacionado para o sacerdócio, Figueira iniciou curso no Seminário Católico de Funchal, em 1824, sem conclusão, egresso em 1833, deixando Portugal para residir no Brasil, onde concluiu os estudos para receber ordens sacras. "Em 1839 'os moradores na Freguezia de Caboverde' pedem ao Bispo de São Paulo a confirmação do Padre João Domingos Figueira para seu Parocho" (Padre dr. Hiansen, Documentos de Arquivos - ACMSP, 1998).
João Domingos Figueira foi pároco nomeado, a pedido da população, para Cabo Verde - MG, a contar de 1º de outubro de 1839 "por seu comportamento, lisonjeiras esperanças de bem servir a igreja" (Carvalho, 2003: 34).
O reverendo padre Ignácio Ribeiro do Prado e Siqueira, em alguns assentos de batizados em Cabo Verde - Minas Gerais, atesta batizador o padre João Domingos Figueira, a partir de 1835 (Livro de 1821-1836: 135, exemplo de 31/05/1835).
Documentos resgatados pelo padre dr. Hiansen Vieira Franco, em novembro de 2012, revelou os "Auttos de Collação da Igreja de Cabo-Verde a favor do Reverendo João Domingos Figueira", de 27 de junho de 1842, sob o Decreto Imperial de 06 de maio do mesmo ano (Padre dr. Hiansen, Documentos de Arquivos - ACMSP, 1998).
—'Padre Colado' tinha a mesma condição de funcionário público, inclusive com ingresso através de concurso.
Aos 23 de agosto de 1845, o padre Figueira pediu renúncia do cargo, em Cabo Verde, quando "lá não podia permanecer com ameaças consecutivas de morte" (Carvalho, 2003: 188), sem esclarecimento da causa. 
O requerimento não prosperou ou algo acordado entre as partes, até 1858, quando novo pedido do padre:
—"Vinte e dois annos de continuada perseguição nesta Freguezia, è motivo mais que sufficiente para renunciar, pela segunda vez, o beneficio de Nossa Senhora da Assumpção de Cabo Verde, onde por infelicidade sou collado (...)." (ACMSP, Autos de Renúncia de Benefícios - Paróquia de Cabo Verde, MG, 1858: 15/03, apud padre dr. Hiansen: 2012 - Documentos de Arquivos).
A solicitação foi aceita pelo 'Bispado de São Paulo' e publicada pelo Governo da Província de Minas Gerais (Correio Official de Minas, 29/03/1858: 1-2), e Figueira perdeu sua condição de vigário colado, daí um hiato em sua biografia entre 30 de março de 1858 a 02 de novembro de 1860. 
Entre 03 de novembro de 1860 a 30 de junho de 1861, comprovadamente, o padre Figueira encontrava-se em Divinolândia - Capela Rio do Peixe, no exercício de atividades religiosas como 'cura' (Records Preservation - Livro de Matrimônios - Caconde, 1857/1891: 670-678). 
—'Cura' era o padre responsável por um 'Curato', ou seja, uma 'Capela' já em condições para se tornar Paróquia.
Ainda 1861, Figueira mudou-se para Santa Cruz do Rio Pardo, "Comprando uma grande fazenda no Rio Pardo foi cultival-a, deixando de parochiar." (A Reforma, 19/12/1878: 2), adquirida de Manoel Francisco Soares, no ano de 1861.
—Aos de 02 de julho de 1873 num expediente ao governo paulista, Figueira confirmaria sua presença na região desde 1861, "conhecedor destes lugares, onde habito á doze anos" (ALESP, EE 73_27.1).
'Progresso de Tathuy', de 12/12/1878, descreveu a participação do Padre Figueira na origem do lugar: "Foi elle quem mandou derrubar a matta, onde hoje é a villa de Santa Cruz do Rio Pardo, e mandou ahi fazer-se a primeira roça." (In A Reforma, 19/12/1878: 2). 
O ativismo de Figueira atraiu rivalidade do Padre Andrea Barra, Vigário em São Domingos. Os padres desavieram-se e, por carta ao Bispado de São Paulo. Figueira comunicou e denunciou: 
"Os habitantes de Santa Cruz do Rio-Pardo filial de Sam Domingos termo de Botucatu, encarregando-me como seu procurador. Dois anos habitei entre elles, neste tempo erigio-se huma capella mór com presbiteryo, altar sacraico, throno retabulo, forrada, assoalhada, com corredores dos lados o mesmo e sachristia. O patrimonio doado tem sem alqueires, mais ou menos, terreno proprio para grande povoação, agua pelo alto com abundancia, apresenta este logar um futuro risonho. A afluencia de povo de todas as partes é immensa. As divisas combinadas com os moradores, e as mais apropriadas devem ser: Principiando na foz do rio Pardo com o Paranapanema, subindo este até frontiar em linha reta com o ribeiro Santa Clara, descendo este a entrar no Turvo, descendo este athe onde principiou a divisa.
Esta Capella dista de S. Domingos quatorse leguas, o vigario bastante inpolitico negou-me todas as licenças para baptisados e casamentos, talves julgando que o privaria de seus emulumentos. Estes habitantes tendo entre si um padre vio-se na dura necessidade, com incommodos innauditos hirem para S. Domingos e dispesas imcompativeis, subscrivendo cotas para o vigario ir, ao lugar, e assim mesmo, não hia se não por, contribuição espantoza, como fosse a benção do cemiterio q. exigio oitenta mil reis dizendo que era a licença, quando a provisão q tenho de cemiterio para minha fazenda importou hum mil duzentos e oitenta.
Senhor esta capella não foi benta e para esse fim requeiro a V. Ex. faculdade para mim ou outro sacerdote de confiança sua. Assim mais a ereção de pia Baptismal. V. Ex. que em todos os actos de sua sublime administração tem apresentado amor paternal, caridade, e desinteresse. Eu em nome daquellas ovelhas submissas do seu grandioso rebanho supplicamos serem atendidas.
Eu, e aquelles ficamos rogando a Deos pela conservação de sua vida apreciavel para ingrandecimento das almas por isso.
Ilegivel-." (ACMSP, Documentos Diversos para Santa Cruz do Rio Pardo).
A carta, documento inédito, revela entrelinhas o desejo de Figueira assumir as funções sacerdotais em Santa Cruz. no entanto negocia sua nomeação para a freguesia Nossa Senhora da Conceição do Bom Sucesso, atual Caconde. Ofício da Presidência da Província de São Paulo ao Bispado de São Paulo revela os acontecimentos:
—"Ao exm. bispo diocesano – Passo ás mãos de v.ex. o incluso officio em que o padre João Domingos Figueira dá parte de achar-se a freguezia do Bom Successo desprovida de parocho para que v.ex. se digne tomar este objecto na consideração, que julgar conveniente." (Correio Paulistano, 16/04 1863: 3).
Padre Figueira conseguiu nomeação para o lugar, como Vigário Encomendado (RG, BN 1003, 1863/1864: 40 – Mapa S/N; RG, U 1005, 1864/865: 8-9), em setembro de 1863, e por lá permaneceu quase nada, assim revela outra carta do padre ao Bispado de São Paulo, datada de 13 de fevereiro de 1864, solicitando demissão, e queria mesmo Santa Cruz do Rio Pardo: 
—"Com magoa levo ao conhecimento de S.Ex.Rev. o que se tem passado neste infeliz lugar há 6 mezes. Convidarão-me para vir ao lugar e fazer meus contratos, estive hum mez ... -me a que fizesse minha mudança, propuz condições acceitarão, e um lugar onde empregasse os cativos, tudo foi franqueado; porem a peçonha do Hydra estava encerrada nas viceras do depravado que me convidou para este lugar por nome Fernando, este homem é quem afiançava, porem logo q. aqui cheguei portou-se diferente, negando-se ao seu lado, só passado tres mezes, depois de varios desgostos afiançou porem a 10 de Fevereiro quando completava seis mezes ... que os parias não querião mais minha continuação como vigario: não podem elles justificar faltas só sim a 10 de Fevereiro não dei cinca porque não achei palma benta no lugar que elles chamão Igreja, não achei theribulo, no acto ... ... não havia vinho pa. a Missa, e no dia dois ... . No dia dois de Novembro p.p. tambem esse senhor feudal sentio-se porque não o esperei e ... quando quisesse ... são as faltas q. elles o ligão. Em vista do acontecido tenho de regressar para minha fazenda em Sta. Cruz do Rio Pardo, onde fico esperando as determinações de V.Ex. dirigindo-se p. Botucatu. Ainda que quizesse continuar-se pelos emulumentos estes são tão limitados que não dá para o café, Missas neste lugar não há, tudo he mizeria.
V.Ex.Rº atendendo ao expendido asseitará minha dimessão, não me nego a servir a Deos e á Igreja, e em Sta. Cruz existe uma nova povoação cujo povo bem dedicado ao servisso de Deos e da Igreja com minha estada de dois annos fosse uma Capella môr, forrada, assoalhada, com Prezbiterio, altar, trono, sacrario, e retabulo. O patrimonio doado é de 100 alqueires já conta com 18 a 20 fogões no arraial. A afluencia do povo é imensa.
Deos G. a V.Ex. Revª - muitos annos. Bom Sucesso - 13 de Fevereiro de 1864.
O V. João Domingos Figueira" (ACMSP, Documentos Diversos para Santa Cruz do Rio Pardo).
A carta desabafo diz muito de Santa Cruz, para onde Figueira retornou à vida de fazendeiro, e, a despeito dos seus entreveros com o vigário Andrea Barra, realizou alguns ofícios religiosos, revela-os o forâneo Padre Bartholomeu Comenale, em 1893:
—"(...) no anno de 1867, nesta Matriz, o Revdo. Pde João Domingos Figueira baptizou José, de poucos dias, filho legítimo de Francisco Theodoro de Souza e Maria Magdalena de São José, foram padrinhos José Botelho de Souza e Lina Honória de São José." (Eclesial, SCR. Pardo, 1873/1896; 150).
Aparentemente Padre Figueira não demonstrou nenhum interesse pela vigararia de São Domingos, ou que fosse convidado, quando da morte do Padre Andrea Barra em setembro de 1870. Somente retornaria ao serviço religioso, como coadjutor ou capelão em Santa Cruz, com a posse do Padre Francisco José Serôdio, aos 15 de março de 1872, para São Domingos. Figueira permaneceu nas funções até sua nomeação como o primeiro vigário de Santa Cruz, aos 15 de março de 1873 (Câmara Episcopal de São Paulo, apud ALESP, CO 073-001.1).
O Padre João Domingos Figueira faleceu em Santa Cruz do Rio Pardo, aos 26 de novembro de 1878, e seu corpo sepultado no piso da matriz, próximo do altar (Oliveira Zanoni, 1976: 57); e sua morte noticiada pelos jornais da época. 
O paulistano 'Jornal da Tarde', edição de 17/12/1878 – página 2, reportou:
"Com 69 annos em Santa Cruz do Rio-Pardo, falleceu o revd. vigario padre João Domingues Figueira, primeiro povoador daquella villa.
Deu Liberdade a trinta escravos, e fez diversos legados pios.
Era um verdadeiro apostolo do bem, pelo que os seus parochianos muito sentirão a sua morte." 
'Diário de Tathuy', SP, arrematou "O padre João Domingues gozou de uma bonita reputação como homem e como sacerdote. O povo santa-cruzense sentiu a sua morte" (Apud Província de São Paulo, 19/12/1878: 2).

2.2.2. Vida 'extra clerical' do padre João Domingos Figueira
2.2.2.1. Fazendeiro escravagista
O padre João Domingos Figueira era um homem rico. Em Cabo Verde - MG são relatados escravos seus, peças caras e destinadas aos trabalhos rurais e domésticos. 
Sua escravizada Batistinha, por exemplo, em 1846 teve o filho Jeremias (Cabo Verde - MG, Batismos, 1809/1859: 42), igualmente lançado como escravo no seu plantel.
Quando o padre Figueira foi paroquiar em Caconde - SP, em 1864, estava acompanhado de seus cativos que lá seriam empregados, certamente como mão-de-obra alugada.
Convidarão-me para vir ao lugar e fazer meus contratos, estive hum mez ...-me a que fizesse minha mudança, propuz condições acceitarão, e um lugar onde empregasse os cativos, tudo foi franqueado (ACMSP, Documentos Diversos para Santa Cruz do Rio Pardo).
O padre retornou a Santa Cruz do Rio Pardo com a escravaria, conforme os diversos assentos eclesiais. 
Sua fazenda em Santa Cruz, conhecida como 'Fazenda do Padre' era uma das melhores na região, situada às duas margens do rio Pardo, confinada a partir do Salto da Boa Vista, onde ainda [2020] ruínas da Usina Velha [hidroelétrica], com o ribeirão Grande. hoje divisa territorial entre os municípios Santa Cruz do Rio Pardo e Ipaussu, e, ainda, respeitadas as divisas de fundo e testada (DOSP, 19/03/1898: 23.174). Pelo caminho da fazenda, a passagem pelo Pardo, a primeira ponte para adiante de Santa Cruz em direção às povoações: Rio Novo [Avaré], São Sebastião do Tijuco Preto [Piraju], Três Ranchos [Cerqueira Cesar], e outras.

2.2.2.2. Dos herdeiros legatários
O inventário do padre João Domingos Figueira, ainda a trâmite no ano de 1896 (DOSP, 19/03/1898: 23.174), apresentava como seus herdeiros legatários de ambos os sexos:
-João Bonifácio Figueira, nascido por volta de 1850, casado com Maria das Dores de São José [família Botelho], residente em Santa Cruz do Rio Pardo. Após a morte do padre batizou o filho Arlindo com o sobrenome Ornellas Figueira, e, desde então a identificar-se, publicamente, como filho do padre (Alistamento Geral dos Eleitores Federais – SCR. Pardo, 1902: 9).
-Benvinda Carolina do Espírito Santo, casada com Manoel Gomes Nogueira, residente em Caconde - SP.
-Mariana Rosa do Amor Divino, casada com Luiz Antonio Rodrigues, residente em Santa Cruz do Rio Pardo.
-Maria Innocencia da Conceição, casada com José Joaquim Gomes, residente em Santa Cruz do Rio Pardo.
-José Chrisante [Chrisostomo] Figueiracasado com Umbelina Rosa de Jesus, no batizado da filha Virgilina, aos 27 de março de 1878 (ACMSP - SCR.Pardo, Batismos 1872/1879: 89-90); consorciado em segunda núpcias com Amélia Maria de Lima (ACMSP - SCR.Pardo, Matrimônio Livro 1893/1900: 66), residente em Santa Cruz do Rio Pardo. Adotou o nome José Baptista Figueira, após a morte do padre. 
-Antonio Emilio Figueira, viúvo de Maria da Conceição casou-se em segunda núpcias com Gabriela Sabina de Jesus, (SCR.Pardo, matrimônios Livro 1893-1900: 5), residente em Santa Cruz do Rio Pardo, adotando o nome de Antonio Baptista Figueira, após o óbito do padre.
-Rozalia de tal, escravizada, inclusa no rol de herdeiros do padre, residente em Santa Cruz do Rio Pardo.
Certa 'Maria Bernardina', residente no 'Bairro [rural] dos Campanhas', teve em seu registro de óbito, de 02 de setembro de 1889, a identificação dada pelo marido, José Antunes Vieira, ser ela "filha natural do finado Padre João Domingos Figueira" (Cartório de Registro Civil – SCR. Pardo, Livro C-1 nº 122: 41), sem constar o nome da mãe, porém, assento eclesial de óbito, de 02 dos mesmos mês e ano, consta 'filha de pais incógnitos' (Livro 1883/1897: 35), e, exceto nas vagas lembranças da família 'Pereira Lima ou Pereira de Lima', nenhum documento pode comprova-la filha do padre, nem foi ela arrolada herdeira.
—Durante algum tempo Maria [Bernardina] foi confundida com a homônima filha da escrava Rozalia, do plantel do padre Figueira, por se confundir como nome composto materno 'Mizael Rozalia', quando, em verdade, o casal 'Miguel e Rozalia' (Batismos Livro 1859/1879: 191).
—Da Maria Bernardina, em outubro de 2020 localizado o documento de seu batismo na localidade de Santa Cruz do Rio Pardo, ocorrido aos 15 de outubro de 1861, idade de vinte dias, filha de Maria Neves de Jesus, pai ignorado, sendo padrinhos José Pereira de Lima e Anna Bernardina de Jesus (Livro 1859/1879: 89), a comprovar os antigos relatos dos Pereira Lima. 

2.2.3. As mulheres mães dos legatários do padre João Domingos Figueira
Não foram encontrados registros, até outubro de 2020, dos assentos eclesiais de batismos e casamentos dos legatários do padre João Domingos Figueira, tanto em localidades onde ele tenha prestado seus serviços religiosos ou nelas residido, quanto em povoações circunvizinhas, nas províncias mineira e paulista. 
À igual maneira, não revelado nenhum nome de mãe ou mães dos elencados herdeiros do padre; nem qualquer registro cartorial de óbito deles consta o nome da mãe - sempre desconhecido ou ignorado, inclusive com a incerteza dos lugares de nascimentos. Mesmo em lançamentos cartoriais de netos nascidos, já de um segundo matrimônio do pai - herdeiro legatário do padre, são ignorados os avós paternos, conforme o exemplo, tomado aleatoriamente:
—José Baptista, filho de Antonio Baptista [ou Emilio] Figueira e Gabriella Joaquina [ou Sabina] de Jesus, nascido aos 05 de fevereiro de 1894 (assento eclesial) registrado civilmente aos 22/10/1928, traz os avós maternos, porém, ignorados os paternos (Cartório de Registro Civil - SCR. Pardo - SP, Nascimentos, Livro A-32 fls. 9 nº 628 - 05/02/1894 registrado em 22/10/1928).
Ainda nos anos de 1970 especulavam-se sobre os herdeiros do padre Figueira em Santa Cruz do Rio Pardo, não havendo dúvidas que tais seriam seus filhos e filhas, aliás, o mais famoso deles, João Bonifácio Figueira, e apenas ele, após a morte do padre identificou-se filho do reverendo (Santa Cruz do Rio Pardo, Resumo dos Eleitores Federais -1904: 9 - n. 217), no entanto, mesmo em seu óbito não informado o nome da mãe. 
Nestes considerandos, o padre João Domingos Figueira, era religioso por formação clerical, declarado solteiro, comprovadamente fazendeiro e escravagista, suspeito de ser pai de filhos e filhas nascidos de mãe ou mães ignoradas, e, aos herdeiros identificou-os nominalmente legatários. 
Se conhecidos os nomes dos possíveis descendentes do padre, nenhuma progenitora é citada, assim como desconhecidos os lugares de nascimentos e casamentos daqueles anteriores a sua vinda para Santa Cruz do Rio Pardo, onde obrigatoriamente constaria o nome da mãe ou se expostos. A única certeza encontrada foi a intenção deliberada, por parte daquele que detinha o poder sobre os assentos eclesiais, ocultar os registros que poderiam tudo esclarecer.
No entanto, indícios documentais permitem, por inquirição, apontamentos que identificam as suspeitas mães, com grau mínimo de erro: 

I) Da Benvinda Carolina do Espírito Santo:
A Benvinda era vinculada, filialmente, a certa 'Benvinda Belmira Carolina do Espírito Santo', mencionada em 1846 como pessoa solteira, no batizado de 'Jeremias, filho de Batistinha, escrava do padre João Domingos Figueira' (Cabo Verde - MG, Batismos, 1809/1859: 42).
—A filha Benvinda Carolina do Espírito Santo, foi casada com Manoel Gomes Nogueira, com o qual residente em Caconde - SP (Records Preservation - Livro de Batismos, 1858/1867: 515-516, do filho Olympio aos 09/09/1855; e no mesmo livro, às páginas 516, o batismo da filha Lina aos 30/05/1857); do casal, ainda, um filho por nome Antonio, falecido em Caconde - SP, aos 19 de dezembro de 1884, idade de 25 anos. Não localizado o assento matrimonial de Benvinda e Manoel, e no óbito dela não revelado os pais.
Não restam dúvidas quanto à progenitora de Benvinda Carolina do Espírito Santo. 

II) Dos conhecidos João Bonifacio Figueira e a irmã Marianna Rosa
O João Bonifacio apresenta-se casado já em 1868, com Maria das Dores de São José - ou Maria das Dores Botelho, filha de José Botelho de Souza e dona Luiza Thereza de Jesus, no batismo do filho João em São Pedro do Turvo (Paróquia de Santa Cruz do Rio Pardo, Livro 1873/1896: 55 - transcrição).
Quando já falecido o padre João Domingos Figueira, o João Bonifacio assumiu ser o seu filho sem revelar a mãe, porém, deu ao seu nascituro Arlindo, nascido aos 06 de setembro de 1879, em Santa Cruz do Rio Pardo, o sobrenome 'Ornellas', assim, 'Arlindo Ornelllas Figueira' (Livro de Batismos 1872-1889: 97).
—O sobrenome Ornellas que João Bonifácio deu ao filho Arlindo poderia ser homenagem aos 'Figueira Ornellas - do casal Manoel Lopes Figueira Ornellas e Eduarda Julia de Barros', vindos de Portugal para Cabo Verde - MG, na década de 1840, parentes diretos do padre João Domingos Figueira.
Manoel Lopes Figueira Ornellas e Eduarda Julia de Barros chegaram ao Brasil nos anos 1840, com os filhos conhecidos: Elias Lopes Figueira Ornellas, João Lopes Figueira Ornellas, Joanna Julia de Barros - ou Figueira Ornelas e Jacintha Julia de Barros ou Figueira Ornellas"Todos falecidos e sepultados no cemitério municipal de Cabo Verde, à exceção de Jacintha que casou-se e foi residir em Santa Cruz do Rio Pardo, SP, onde faleceu." (Da 'Folha de Cabo Verde' de 30/10/91 - nº 24, apud Adilson de Carvalho, 'A Freguesia de Nossa Senhora da Assumpção do Cabo Verde e sua História, 1998: 370), sem a revelação, e, nada localizado, de quem seria o marido de Jacintha.
A despeito das informações mineiras, não localizado o matrimônio de Jacintha em Cabo Verde - MG e região, nem qualquer informação outra do seu nome na paróquia de Santa Cruz do Rio Pardo - SP, se casada ou viúva, viva ou falecida, nem registros de possíveis descendentes; e a Jacintha passaria ignorada para a história, não fosse o João Bonifácio Figueira homenageá-la com o sobrenome Ornellas ao filho Arlindo.
—Mera especulação, por qual outra razão seria, senão o sobrenome Ornellas, estranho aos Figueira 'santa-cruzenses', na pessoa de um neto?   
João Bonifácio, pelos seus descendentes conhecidos, era branco, e seu filho 'Arlindo Ornellas Figueira foi casado com Laura Martins', com a qual teve o filho Samuel Martins Figueira, médico conhecido em Santa Cruz do Rio Pardo, falecido aos 12 de dezembro de 1993, idade de 83 anos.
Quanto a Marianna Rosa do Amor Divino sabe-se casada com Luiz Antonio Rodrigues, e, teve, entre outros, o filho 'Luiz Antonio Rodrigues' - mesmo nome do pai, casado com 'Flauzina Bernardina da Luz' - com a qual teve a filha 'Lazara Rodrigues', inconfundivelmente branca, falecida aos 30 de agosto de 1979, viúva do famoso farmacêutico e político santa-cruzense Alziro de Souza Santos.   

III) Dos irmãos José Chrisostomo Figueira, Antonio Emilio Figueira e Maria Inocencia
O José Chrysostomo Figueira, num documento aparece como José Chrysante (DOSP, 19/03/1898: 23.174), após óbito do padre mudou seu nome para 'José Baptista Figueira'; à mesma maneira que o Antonio Emilio Rodrigues modificou o seu para 'Antonio Baptista Figueira'.
Chama atenção a colocação do sobrenome 'Baptista', apontando a possibilidade de serem filhos da já citada 'Batistinha', escrava do padre João Domingos Figueira, mãe do escravizado Jeremias, negro nascido em Cabo Verde - MG, no ano de 1846, de pai incógnito. 
Já em Santa Cruz do Rio Pardo, Batistinha teve um filho por nome Antonio, de pai não revelado, batizado aos 25 de novembro de 1862, idade de três meses (Livro 1859/1896: 191). Ela é identificada como escrava do padre, mas não o filho, quando ainda não prevalecia a 'Lei do Ventre Livre, de 28/09/1871', a indicar pai branco dono do plantel. 
Antonio, por ter nascido em Santa Cruz do Rio Pardo e em época mais recente, facilitou, em termos, as pesquisas, sendo possível saber de sua viuvez - por falecimento de sua primeira mulher, Maria da Conceição, e do segundo matrimônio, aos 03 de fevereiro de 1894, com Gabriella Sabina [ou Joaquina] de Jesus, filha de Manoel Antonio de Faria e Joaquina Sabina de Jesus (Livro 1893/1900: 5), sem registro civil. 
—O Antonio sobreviveu sua segunda mulher, Gabriella, morta aos 21 e sepultada aos 22 de junho de 1926, idade de 48 anos (Prefeitura Municipal - Cadastro/Óbitos 09/10/1918 - 23/08/1989: 2.678); o seu óbito ocorreu aos 30 de outubro de 1928, filho de pais ignorados (Cartório de Registro Civil de Santa Cruz do Rio Pardo, Livro C-18, fls. 188, nº 283). São notados seus filhos, como exemplos, o João Baptista Figueira, falecido aos 13 e sepultado aos 14 de julho de 1950, idade de 65 anos (Prefeitura Municipal - Cadastro/Óbitos 09/10/1918 - 23/08/1989: 16.554), portanto do primeiro matrimônio do pai, e o José Baptista Figueira, que nasceu do segundo leito nupcial, aos 05 de fevereiro de 1894 - civilmente registrado aos 22/10/1928 em Santa Cruz do Rio Pardo (Cartório do Registro Civil, Livro A-32, fls. 7, nº 628), sem identificações dos avós paternos.
Não restam dúvidas que é esse o Antonio, filho da escravizada Batistinha, herdeiro legatário do padre João Domingos Figueira, que não o colocaria nessa situação se fosse filho de outra pessoa branca.  Pelo mesmo curso investigativo, igualmente filhos libertos de Batistinha, o José Baptista Figueira e a Maria Inocencia, ambos citados no rol de herdeiros do padre.
Cumpre observar que o Jeremias, filho primeiro de Batistinha, continuou escravo do padre Figueira, em Santa Cruz do Rio Pardo, casado com a escravizada Maria Magdalena - do mesmo plantel, sendo conhecidos os filhos Cyrillo, nascido em 1875, e Maria nascido em 1876, ambos enquadrados na 'Lei do Ventre Livre de 28/09/1871(Batismos, Livro 1873/1896: 39 e 41, respectivamente). 
—Jeremias, após a morte do padre Figueira, adotou os sobrenomes Figueira Baptista, assim observado em 17 de junho de 1880, no batismo de Rozalina, nascida livre dos escravos Sebastião e Maria Crioula, ambos do finado padre e ainda continuavam nesta situação (Livro de Batismos, 1873/1896: 44). Jeremias também conhecido pelo sobrenome Baptista Figueira, não foi enquadrado herdeiro legatário do reverendo, evidentemente por não filiação biológica do padre.
Os irmãos José, Antonio e Maria, são identificados pardos ou mulatos, assim como seus descendentes, enquanto os filhos de Jeremias eram negros. Nenhum deles teve destaques na sociedade santa-cruzense. 

IV) Justificativas para ausências de documentos dos legatários e suas mães
O padre João Domingos Figueira tinha em sua fazenda cemitério particular, mencionado em uma de suas cartas ao Bispado de São Paulo: "(...) quando a provisão q tenho de cemiterio para minha fazenda (...)." (Cartas do padre João Domingos Figueira, 1862, ACMSP - CD: A/A). 
Rompido com o padre Andrea Barra, vigário de São João de São Domingos (Cartas op.cit, 1862), o reverendo João Domingos Figueira mantinha oratório particular onde realizava suas devoções e, eventualmente, cerimônias familiares e privadas, como exemplo o ato de batismo em 1867 - já acima citado e transcrito, atestado pelo vigário santa-cruzense, Bartholomeu Comenale, em 1893 (SCR. Pardo, Livro de Batismos de 1873/1896: 150).
Exceto alguns relatos informados ou transcritos, nenhum assento eclesial - cópia do original de ato religioso ministrado e assinado pelo padre Figueira, em seu oratório particular, chegou aos dias atuais.
—Dos livros dos assentos eclesiais de Cabo Verde - MG, o de número oito desapareceu nos tempos do padre Figueira por lá vigário colado. Consulta noutro livro de registros eclesiais do lugar, o entre os anos 1809/1859: 55 em diante, constam assentos feitos posteriormente às pessoas interessadas, por informações comprovadas por testemunhos, estranhamente coincidente com o período que nasceram os mineiros cabo-verdenses - os primeiros legatários do reverendo, e, alguns, até, provavelmente se casaram na localidade.   
Não restam dúvidas que os legatários do padre João Domingos Figueira eram seus legítimos filhos, à exceção, evidentemente, da escrava Rozália, vista como 'ama de leite e cuidadora' dos descendentes brancos do reverendo, daí as interrogações que ainda persistem: 
—À exceção sobre a Batistinha, quando e onde aquelas mães faleceram ou findaram seus relacionamentos com o pai de seus filhos? Se elas se conheceram algum dia, cientes daquilo que cada uma representava na vida do padre?
—Onde calados os documentos nada se pode historicamente pressupor, por mais atiçadores que sejam os segredos que apenas o padre e Rozalia conheciam, segredos estes que jamais serão revelados.
Aparentemente o padre Figueira relacionava-se bem com os filhos brancos: João Bonifácio, Benvinda e Marianna, com os respectivos cônjuges, presente em batizados de alguns netos como batizador e/ou padrinho. Já a convivência com os descendentes mulatos pareceu mais conflituosa, talvez em razão do padre manter a progenitora deles, Batistinha, sempre no rol de escravos, assim como o Jeremias, filho dela com pai negro ignorado, ato certamente imperdoável para os irmãos José, Antonio e Maria Inocencia.
Da Maria Bernardina, nada se pode afirmar com segurança, mesmo que relativa, mas, não se pode duvidar, pelos antecedentes, que tenha sido rejeitada pelo pai.

2.2.4. O padre Figueira no contexto histórico santa-cruzense
Nenhum juizo de mérito, por parte dos autores, quanto a vida particular do reverendo padre João Domingos Figueira, se conhecida ou desconhecida dos santa-cruzenses da época, a importar somente ter sido ele o grande nome na formação histórica de Santa Cruz do Rio Pardo, ao lado de Manoel Francisco Soares, e suas cartas, referentes ao ano de 1862, revelam, inconteste, a origem local.
Sem a presença do padre Figueira no início da formação de Santa Cruz do Rio Pardo, com todos os desdobramentos consequentes, a história não seria esta; impossível imaginar, a história não registra impossibilidades e sim tentativas e feitos, independentemente do ocultamento desejado ou que melhor fosse.

2.3. Joaquim Manoel de Andrade não foi cofundador de Santa Cruz do Rio Pardo**
Foto atribuída a Joaquim Manoel de Andrade
- domínio público -
Quando da qualificação administrativa para Santa Cruz, como freguesia em 1872, Joaquim Manoel de Andrade destacou-se líder, e seu nome, desde então, a ilustrar os principais cargos, por eleições ou nomeações. 
A história identifica-o respeitável cidadão, religioso prestante, fazendeiro, criador de porcos, dono de serraria, capitalista e escravagista.
Andrade nasceu em Pouso Alegre -MG, em 12 de novembro de 1825 e batizado aos 20/11/1825 (Eclesial), filho de João Bernardino da Silveira e dona Bernardina Jesuina de Santa Catarina (Projeto Compartilhar, pesquisa de Paola Dias, Cap. 4º – Ângela Pires de Moraes: 9.8).
— São os seus irmãos e irmãs conhecidos: 
- Floriana Maria de Jesus: Pouso Alegre-MG, LB 1825/1825: 95; e LM 1832/1856: 47;
- João Bernardino Silveira: Airuoca-MG LM 1787/1814: 246;
- Joaquina Maria de Jesus: Pouso Alegre-MG LM 1832/1856: 38;
- José: Aiuruoca-MG LB 1808/1816: 156;
- Manoel Joaquim de Andrade: LM 1832/1856: 29;
- Maria ...: Aiuruoca-MG LB 1808/1816: 103;
- Marianna Esméria de Jesus: Pouso Alegre-MG LB 1815/1823: 94; e LM 1832/1856: 34;
- Messias José de Andrade: Pouso Alegre-MG LM 1832/1856: 11.
Joaquim Manoel de Andrade apresentou-se no sertão paulista, com dois irmãos identificados, Messias José de Andrade e Manoel Joaquim de Andrade, os quais, juntamente com o pai João Bernardino da Silveira, adquirentes da fazenda cuja sede viria ser a povoação de São João de São Domingos.
O irmão Messias seguiu depois para os lados do Alambari, no Turvo, Manoel seguiu rumo para Lençóis Paulista, enquanto Joaquim iniciou história santacruzense em 1870/1872, como rico fazendeiro, conhecido primo-irmão do homônimo desbravador no Turvo e Capivara, e do pioneiro-mor José Theodoro de Souza, sendo irmãs as mães dos três, respectivamente Bernardina Jesuína de Santa Catarina, Mariana Rosa da Assunção e Maria Teodora do Espírito Santo (Projeto Compartilhar, Família Bernarda Maria de Almeida). 
Andrade se tornou importante nome na história santa-cruzense-do-rio-pardo, de 1872 a 1891, elegido o 1º Juiz de Paz de Santa Cruz, em 1875 - pleito anulado em 1876, depois eleito vereador em 1876 para a primeira legislatura (1877/1880), consagrando-se como o primeiro Presidente da Câmara, e reeleito para o cargo em outras oportunidades disputadas. Em 1884 integrou o Rol de Ilustres, pela Câmara Municipal, ofício de 12 de novembro de 1884, para compor a comissão responsável pelas obras da Igreja Matriz. Respondeu, ainda, por cargos púbicos em nomeação: Delegado de Polícia – 1877 (Diario de S. Paulo, 25/11/1877: 2), Coletor de Rendas - 1879, e, designado Presidente do Conselho da Intendência Municipal - 1890 até sua morte em 1891.
Joaquim Manoel de Andrade foi com Umbelina Maria de Jesus ou Ferreira do Nascimento, em São João do Jaguary - atual São João da Boa Vista - SP, aos 09 de novembro de 1845 (Curia Diocesana de São João da Boa Vista, Matrimônio, apud Henrique Dias da Silva Junior - pesquisador/historiador - Assis-SP, CD: A/A 05/09/2017), sendo ela nascida em Pouso Alegre - MG, onde batizada aos 12 de maio de 1833, com a idade de 13 dias, (Batismos, Livro 1825/1837: 285, https://www.familysearch.org/), filha de Manoel Antonio Rodrigues e Maria Ferreira, sendo testemunhas do casamento Domiciano José de Andrade e Manoel Antonio Rodrigues. 
O casal teve os seguintes filhos conhecidos: 
-Maria (Batismo: São João da Boa Vista, LB 1833/1858: 134, aos 04/04/1847 - Records Preservation);
-Bernardino (Batismo: São João da Boa Vista, LB 1833/1858: 159, aos 02/04/1849 - Records Preservation);
-José (Batismo: São João da Boa Vista, LB 1833/1858: 181, aos 24/04/1851 - Records Preservation);
-Manoel (Batismo: Botucatu, LB 1849/1856: 54, aos 30/07/1853, idade de seis meses - Family Search); 
-Theodora (Batismo: Botucatu, LB 1856/1859: 81, aos 04/09/1858, idade de seis meses - Family Search);
Certidão Eclesial de Casamento do Joaquim Manoel de
Andrade e Umbelina Ferreira do Nascimento 
-Joaquim (Batismo: São Domingos, LB 1859/1879: 68, 05/02/1860, idade de 20 dias - 
Family Search); 
-Antonio (Batismo: São Domingos, LB 1859/1879: 85, aos 01/09/1861, idade de oito dias) - Family Search;
-João (Alistamento Eleitoral: SCR.Pardo, ano 1890, nascido por volta 1862); 
-Silvestre (Matrimônio: SCR.Pardo aos 31/10/1891, nascido por volta de 1868); 
-Pedro (Alistamento Eleitoral: SCR. Pardo, ano de 1891, nascimento 1869); 
-Benedito (Batismo: SCR. Pardo, LB 1872/1879: 11, aos 26/01/1873, idade de cinco meses - Family Search). 
-Thereza (Batismo: SCR Pardo, nascimento em 1875).
– (Blog, atualizações 2020). 
Andrade faleceu aos 26 de dezembro de 1891, com a idade de 66 anos, em plena atividade política, como Presidente da Intendência do Município, e seus despojos acham-se sepultados na Igreja Matriz de São Sebastião juntamente com os de sua mulher, Umbelina Maria de Jesus, morta em 09 de agosto de 1896. 
Não se tem notícia oficial que o chefe do clã dos Andrades, em Santa Cruz, pertencera à Guarda Nacional; no entanto, referência do padre Andrea Barra em São Domingos, aos 21/02/1858, identifica-o Major e escravagista, na celebração de Missa de 7º Dia pela 'alma do escravo Pae Manoel Thiburcio' (Eclesial, Livro de Batismos, Matrimônios e Óbitos, SCR. Pardo, 1856/1884). 
Noutra alusão foi mencionado como "Capitão" (Correio Paulistano, 17/07/1941: 12), todavia as ausências de referimentos oficiais inviabilizam qualquer assertiva, quando se sabe de três homônimos no sertão paulista da época.
Joaquim Manoel de Andrade teve grande importância na história local e a ele quase tudo se deve na formação do lugar e até transformou-se, nas lendas e tradições, como cofundador de Santa Cruz, o que histórica e documentalmente não procede.
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**Histórico extraído integralmente do original SatoPrado: https://santacruzdeantigamente.blogspot.com/2015/09/os-coroneis-e-mandatarios.html
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3. Encerramento
Resgates históricos quase sempre são implacáveis com seus heróis, fundadores ou de grandes feitos, oficiais ou oficializados, revelando com crueza a verdade sobre eles, muitas vezes despindo-os do manto humanitário de que foram revestidos ao longo dos tempos, como mitos enraizados e embelecidos nas páginas e tradições infundidas na memória coletiva: 'aqui não houve escravidão negra e nem massacre indígena, nossos pioneiros e desbravadores foram homens de boa índole, e as posses sobre as terras, todas elas, mansas e pacíficas'.
Sobre a história de Santa Cruz do Rio Pardo, até onde alcançaram os autores, sugerido o trabalho 'Santa Cruz do Rio Pardo - Memórias, documentos e referências' - http://satoprado-ebook.blogspot.com/